Eddie

Ele estava com muito medo. Seu corpo, muito machucado e dolorido, impedia que ele corresse mais rápido e fugisse daqueles homens que o perseguiam. Ele sabia que não podia ser apanhado senão o machucariam ainda mais e poderiam até matá-lo. Quando um deles o alcançou, tentou mordê-lo, mas logo sentiu que suas mandíbulas ficaram imobilizadas por algo muito resistente. Ele desistiu de reagir, mesmo porque já não tinha mais forças para isso. Não pôde perceber que daí a instantes estavam entrando com ele num prédio em cuja fachada se lia: “Laboratório de Pesquisas Médicas”.

Deitado em uma mesa cirúrgica ele só podia discernir aqueles homens de rostos mascarados, ameaçadores. Suas dores estavam insuportáveis, mas ele não conseguia latir para ter um mínimo de alívio. A única coisa que conseguia fazer era grunhir e espernear e grunhia e esperneava cada vez com menos força. Logo, entretanto, começou a sentir que as dores diminuíam e uma sensação agradável de leveza as substituía aos poucos.

Em pouco tempo estava em um sono profundo. Um sono que o livraria das dores maiores a que estaria sujeito dali em diante e que, também, facilitaria aos médicos mexer nas suas entranhas. Ele nunca tivera sonhos muito claros em sua vida de cão, mas no estado em que se encontrava agora, sua mente era uma tabula rasa que não registrava qualquer sinal de vida. Ele não podia saber, portanto, que aquela experiência tinha o objetivo de salvar uma vida.

Se ele ainda estivesse consciente e se sua consciência fosse igual à dos humanos, ele se lembraria de como tinha vivido livre e feliz ao lado do menino Eddie, o seu companheiro desde que era pequenino. Lembrar-se-ia de como tivera paciência para buscar a bola, a pedra ou o pequeno galho que o Eddie atirava longe, inúmeras vezes, só para vê-lo correr atrás. E riria se soubesse que ambos achavam que com essa brincadeira estava divertindo o outro. O que, de fato, acabava acontecendo. Teria se lembrado, principalmente, que fora uma brincadeira dessas que causara o acidente em que ele e Eddie, naquela manhã, foram atropelados por um carro.

Agora, ambos estavam deitados naquela sala cirúrgica à espera de um milagre que fizesse com que uma vida fosse salva. E os homens mascarados e ameaçadores lutavam para conseguir esse objetivo. E sua luta exigia que revirassem o que estava dentro de seu corpo e do de Eddie.

Quando os seus olhos se abriram novamente e ele pôde ver a mãe de Eddie a seu lado, sentiu que tudo poderia voltar a ser como antes. Entretanto, ao notar os seus olhos vermelhos e tristes, ele logo compreendeu que algo estava errado. Evidentemente, ele não entendeu quando ela lhe disse com a voz embargada:

– A partir de agora vamos chamá-lo de Eddie porque você tem dentro de si uma parte dele.

9 comentários sobre “Eddie

  1. É seu Caco, gostei do que escreveste, quanto mais houver pessoas conscientes de que todo o ser vivente merece respeito, carinho e proteção, aí sim, estaremos no caminho da nossa evolução, tanto material quanto espiritual.
    abs.

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